
Fonte
Maria Fernanda Ziegler, Agência FAPESP
Publicação Original
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Resumo
No sistema reprodutor masculino, o epidídimo é responsável pela maturação e armazenamento dos espermatozoides, e portanto tem um papel central na saúde reprodutiva masculina.
Em ratas prenhes alimentadas com dietas normais ou com baixa proteína durante a gestação e a lactação, pesquisadores puderam comparar a evolução do epidídimo da prole para analisar como a restrição proteica da mãe afeta a saúde reprodutiva dos filhos.
Os pesquisadores puderam observar que a restrição proteica materna ocasiona alterações na estrutura e função do epidídimo e, na fase adulta, essas alterações estavam associadas a prejuízos na qualidade dos espermatozoides, o que pode comprometer a fertilidade dos descendentes.
Os resultados da pesquisa destacam como a fome e a insegurança alimentar podem afetar gerações futuras.
Foco do Estudo
Por que é importante?
Estudos que relacionam a saúde da gestante com o desenvolvimento de seus filhos têm sido conduzidos nas últimas décadas, sobretudo em uma área de pesquisa denominada ‘origens desenvolvimentistas da saúde e doença’ (DOHaD, na sigla em inglês).
Há fortes evidências de que a interação gene-ambiente inadequada durante a fase embrionária e os dois primeiros anos de vida pode ser um fator importante para o aumento da incidência de doenças crônicas não transmissíveis ao longo da vida, como câncer, diabetes, doenças respiratórias crônicas e cardiovasculares. Além destas doenças, a saúde reprodutiva masculina também pode ser afetada.
Responsável por armazenar e transportar os espermatozoides, além de ser o local onde as células espermáticas amadurecem, o epidídimo desempenha um papel importante na reprodução. Trata-se de um ducto localizado na parte posterior de cada testículo que exerce funções específicas que contribuem para a criação de um ambiente intraluminal adequado à concentração e à maturação dos espermatozoides produzidos pelos testículos.
Portanto, estudar como a saúde da gestante pode afetar o desenvolvimento do epidídimo dos filhos é importante para eventualmente melhorar a qualidade dos espermatozoides e a fertilidade masculina.
Estudo
Pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (UNESP) e da Faculdade de Medicina de Marília (FAMEMA) identificaram, em experimentos com ratos, que uma dieta pobre em proteína durante a gestação e o período de amamentação pode comprometer a saúde reprodutiva na prole masculina.
De acordo com estudo, publicado na revista científica Biology Open, a restrição proteica materna ocasiona alterações na estrutura e função do epidídimo no sistema reprodutor masculino, responsável pela maturação e armazenamento dos espermatozoides.
Acompanhando os filhotes até a fase adulta, os pesquisadores observaram que alterações no epidídimo estavam associadas a prejuízos na qualidade dos espermatozoides, o que pode comprometer a fertilidade dos descendentes.
A pesquisa, apoiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), foi a primeira a relacionar a restrição proteica materna durante a gestação e lactação às mudanças na estrutura e função do órgão, ajudando a identificar uma possível causa para a queda na qualidade dos espermatozoide observada nos filhos de mães submetidas a essa dieta.
No trabalho, ratas prenhes foram divididas aleatoriamente em grupos que receberam dietas normais, com 17% de proteína, ou com baixa proteína (6%) durante a gestação e a lactação. Então, os pesquisadores encontraram diversas alterações no epidídimo de roedores cujas mães passaram por restrição proteica.
Fábio Colonheze, mestre em Saúde e Envelhecimento pela Faculdade de Medicina de Marília (FAMEMA) foi o primeiro autor do estudo, orientado pela Dra. Raquel Fantin Domeniconi, professora do Instituto de Biociências da UNESP em Botucatu e autora sênior do artigo.
Cada vez mais estudos têm demonstrado que combater a fome e a insegurança alimentar hoje é também uma forma de prevenir doenças e promover o bem-estar das próximas gerações. Nosso trabalho é um exemplo disso. Além das doenças associadas aos impactos da restrição proteica materna durante a gestação e lactação de ratos, conseguimos demonstrar que há também impacto na saúde reprodutiva da prole
Resultados
“Verificamos que a restrição proteica materna promove alterações importantes no epidídimo. Além de reduzir o comprimento do ducto, a carência de proteína alterou sua estrutura e funcionamento, afetando a dinâmica dos fluidos luminais, a formação de novos vasos sanguíneos e a expressão de diversas proteínas”, relatou a professora Raquel Domeniconi.
Foram observadas ainda alterações no epitélio, tecido que reveste internamente o epidídimo, afetando o processo de diferenciação celular e, por consequência, seu funcionamento.
Além disso, o efeito das alterações ocorridas na fase embrionária se prolongou ao longo da vida dos animais. Entre 7 e 14 dias de vida, ainda no período da lactação, foi observado atraso na diferenciação celular do revestimento do epidídimo dos filhotes de mães submetidas à dieta hipoproteica. A análise do epidídimo desses animais mostrou que havia mais células mesenquimais (que possuem potencial de diferenciação) do que epiteliais.
Todas essas alterações comprometem a maturação e a qualidade dos espermatozoides, com impactos observados aos 44 dias de vida dos ratos – quando se espera que o epitélio do epidídimo esteja totalmente diferenciado e o roedor entre na puberdade.
“O epidídimo é um ducto único e longo por onde os espermatozoides transitam e amadurecem progressivamente. Quando esse ducto é encurtado, as interações dos espermatozoides com o epitélio epididimário e com o ambiente intraluminal ficam limitadas, prejudicando que o espermatozoide se torne funcional e capaz de fecundar um oócito. Não é que os roedores ficaram completamente estéreis, mas a qualidade dos espermatozoides é inferior, o que representa um potencial impacto na fertilidade”, afirmou a pesquisadora.
Para a professora Raquel Domeniconi, os resultados da pesquisa destacam como a fome e a insegurança alimentar podem afetar gerações futuras. A pesquisa mostrou que a dieta da mãe durante a gravidez e a amamentação pode ter impactos duradouros no desenvolvimento do sistema genital dos filhos, o que abre espaço para novas investigações sobre como a nutrição nesse período influencia a saúde reprodutiva.
A professora explicou que, embora seja um problema estrutural – faltam nutrientes essenciais para formar o epidídimo –, a maior parte das alterações observadas é resultado de adaptações do epidídimo para garantir que os espermatozoides amadureçam mesmo em um contexto disfuncional.
São adaptações em cima de adaptações para que, mesmo com essa nova estrutura, seja possível que os espermatozoides amadureçam e mantenham sua capacidade de fertilizar. Afinal, do ponto de vista evolutivo, a reprodução é essencial para a sobrevivência da espécie. Mas, se até a capacidade reprodutiva fica comprometida nesses casos, é de se pensar quanto a desnutrição em fases críticas pode causar alterações profundas no organismo
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Autores/Pesquisadores Citados
Publicação
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