
Fonte
Universidade de Girona
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Resumo
A atual definição de obesidade, que considera apenas valores quantitativos do Índice de Massa Corpórea (IMC), falha ao usar apenas um critério e também ao não separar pessoas com excesso de gordura corporal que só precisam de cuidados daquelas que precisam de tratamento.
Assim, uma comissão internacional de especialistas publicou recentemente um novo estudo em que apresenta outros métodos complementares ao IMC e também uma subdivisão da classificação clínica da obesidade, dividida em obesidade clínica e obesidade pré-clínica.
A comissão também incluiu pessoas vivendo com obesidade e considerou especificamente o impacto potencial das novas definições de obesidade no estigma social que o excesso de gordura corporal pode trazer.
Com a nova classificação e critérios, os pesquisadores esperam que as pessoas possam ser melhor atendidas pelos sistemas de saúde, tanto nos casos que requerem apenas cuidados como nos casos que requerem tratamento.
Foco do Estudo
Por que é importante?
Pessoas com excesso de gordura corporal sofrem frequentemente o estigma social relacionado ao fato de ser ‘gordo’ ou gorda’, sendo que a definição de obesidade clínica até agora considera apenas a medida do Índice de Massa Corpórea (IMC): o peso corpóreo (em kgf) dividido pelo quadrado da altura (em m2).
Associado a esse estigma, ainda paira a discussão (polarizada) sobre o fato de a obesidade ser uma doença ou não. Esses fatos, associados à limitação da avaliação clínica, põem em cheque a busca por cuidados ou tratamentos.
Se o quadro relacionado à gordura corporal for leve, associado apenas a riscos futuros e sem comprometer a função de nenhum órgão atualmente, a pessoa pode precisar apenas de acompanhamento e cuidados. O que onera menos o sistema de saúde em relação a intervenções maiores.
Por outro lado, se a gordura corporal estiver comprometendo a saúde de órgãos e for mesmo classificada como uma doença, é necessário que sejam aplicados tratamentos correspondentes a este quadro.
Neste cenário, fica claro que a análise da obesidade em pessoas precisa ser mais abrangente e considerar uma avaliação individualizada mais completa.
Estudo
Um estudo publicado na revista científica The Lancet Diabetes & Endocrinology, que contou com a participação de uma comissão global de 56 cientistas de 75 instituições médicas e acadêmicas em todo o mundo, apresentou uma abordagem inovadora e detalhada para o diagnóstico da obesidade, com base em outras medidas de excesso de gordura corporal – além do índice de massa corporal (IMC) – e em sinais e sintomas objetivos de problemas de saúde em nível individual.
A comissão internacional foi liderada pelo Dr. Francesco Rubino, professor do King’s College London (KCL) e o Dr. Ricardo Cohen, pesquisador do Centro Especializado em Obesidade e Diabetes do Hospital Alemão Oswaldo Cruz também fez parte da equipe de cientistas. Além dos especialistas. a comissão também incluiu pessoas vivendo com obesidade e considerou especificamente o impacto potencial de novas definições de obesidade no estigma generalizado na sociedade.
O objetivo da proposta é abordar as limitações da definição e do diagnóstico tradicionais da obesidade, que têm dificultado tanto a prática clínica quanto as políticas de saúde, e têm impedido que pessoas com obesidade recebam os cuidados que necessitam.
Ao fornecer uma estrutura clinicamente coerente para o diagnóstico, a comissão também pretende resolver a disputa em andamento sobre se a obesidade deve ser considerada uma doença, que tem estado no centro de um dos debates mais controversos e polarizados da medicina moderna.
É importante observar que a obesidade é atualmente considerada um fator de risco em nível populacional, e não uma condição que reflete a saúde individual.
Critérios atuais são ineficazes
Há um debate contínuo entre médicos e formuladores de políticas sobre a abordagem diagnóstica atual da obesidade, que é propensa à classificação incorreta do excesso de gordura corporal e ao diagnóstico incorreto da doença.
Parte do problema é que a obesidade é atualmente definida pelo IMC, considerando um IMC maior que 30 kgf/m² como um indicador de obesidade em pessoas de ascendência europeia. Pontos de corte de IMC específicos de cada país também são usados para levar em consideração a variabilidade étnica no risco associado à obesidade.
Embora o IMC seja útil para identificar pessoas com maior risco de problemas de saúde, a Comissão salienta que o IMC não é uma medida direta da gordura corporal, não reflete a sua distribuição no corpo e não fornece informações sobre saúde ou doença numa escala individual.
A questão de saber se a obesidade é uma doença é errada porque pressupõe um cenário simplista de tudo ou nada, onde a obesidade é sempre uma doença ou nunca é. No entanto, as evidências mostram uma realidade mais complexa. Algumas pessoas com obesidade conseguem manter a função normal dos órgãos e uma saúde geral adequada mesmo em longo prazo, enquanto outras apresentam sinais e sintomas de doenças graves imediatamente
Resultados
Critérios diagnósticos propostos
Embora reconhecendo que o IMC é útil como uma ferramenta de triagem para identificar pessoas que podem estar vivendo com obesidade, os autores recomendam deixar de diagnosticar a obesidade com base apenas no IMC.
Em vez disso, os cientistas recomendaram confirmar o excesso de massa gorda (obesidade) e sua distribuição no corpo usando um dos seguintes métodos:
- Pelo menos uma medida do tamanho corporal (circunferência da cintura, relação cintura-quadril ou relação cintura-altura), além do IMC.
- Medição direta da gordura corporal (por exemplo, por meio de densitometria óssea ou varredura DEXA), independente do IMC.
- Em pessoas com IMC muito alto (por exemplo, >40 kgf/m²), o excesso de gordura corporal pode ser assumido pragmaticamente.
Obesidade clínica e obesidade pré-clínica
A comissão também propôs um novo modelo para diagnosticar a obesidade com base em medidas objetivas em nível individual, definindo duas condições distintas: obesidade pré-clínica e obesidade-clínica.
A obesidade clínica é definida como uma condição de obesidade associada a sinais e/ou sintomas objetivos de redução da função orgânica ou uma capacidade significativamente reduzida de realizar atividades diárias padrão – como tomar banho, vestir-se ou comer -, diretamente devido ao excesso de peso corporal.
Pessoas com obesidade clínica devem ser consideradas pacientes com uma doença crônica ativa e devem receber tratamento oportuno e baseado em evidências, para restaurar ou melhorar completamente as funções corporais reduzidas pelo excesso de gordura corporal, em vez de focar apenas na perda de peso.
A comissão estabeleceu 18 critérios diagnósticos para obesidade clínica em adultos e 13 critérios específicos para crianças e adolescentes, que incluem:
- Dificuldade respiratória devido aos efeitos da obesidade nos pulmões;
- Insuficiência cardíaca induzida pela obesidade;
- Dor nos joelhos ou quadris, com rigidez articular e redução da amplitude de movimento como efeito direto do excesso de gordura corporal nas articulações;
- Certos distúrbios ósseos e articulares em crianças e adolescentes que limitam os movimentos;
- Outros sinais e sintomas causados por disfunção de outros órgãos, incluindo rins, trato respiratório superior, órgãos metabólicos, sistema nervoso, sistema urinário e reprodutivo e sistema linfático nas extremidades inferiores;
Já a obesidade pré-clínica é uma condição de obesidade em que a função orgânica do indivíduo está normal. Pessoas que vivem com obesidade pré-clínica, portanto, não têm uma doença contínua, embora tenham um risco variável, mas geralmente alto, de desenvolver obesidade clínica e outras doenças não transmissíveis no futuro, como diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares, certos tipos de câncer e doenças mentais, entre outras. Por isso, eles devem receber apoio para reduzir o risco de desenvolver possíveis doenças.
“[Pessoas com obesidade pré-clínica] têm excesso de gordura corporal, mas mantêm funções normais de órgãos, sem sinais ou sintomas de doença ativa”, disse o Dr. Robert Eckel, professor da Escola de Medicina da Universidade do Colorado, nos EUA.
Ou seja, pessoas que vivem com obesidade pré-clínica correm risco de desenvolver doenças no futuro, mas não apresentam complicações de saúde atuais devido ao excesso de gordura corporal. Consequentemente, o foco do seu cuidado deve estar na redução de riscos individualizada.
Considerar a obesidade apenas como um fator de risco, e não como uma doença, pode negar injustamente o acesso a cuidados médicos oportunos a pessoas que estão enfrentando problemas de saúde devido apenas à obesidade. Por outro lado, uma definição geral da obesidade como uma doença pode levar ao sobrediagnóstico e ao uso inadequado de medicamentos e procedimentos cirúrgicos, com potencial para causar danos ao indivíduo e custos desproporcionais à sociedade.
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